Nacionais

Solidão na velhice

(*) Dra. Claudia Ajzen

O aumento do número de idosos é uma tendência mundial e o Brasil acompanha de perto essa enorme mudança na pirâmide etária. Junto dessa transformação, surgem diversos fatores a serem trabalhados, entre eles, a solidão na velhice.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2000, a população idosa com mais de 60 anos era de 14,5 milhões de pessoas, um aumento de 35,5% ante os 10,7 milhões em 1991. Hoje esse número ultrapassa os 29 milhões e a expectativa é que, até 2060, suba para 73 milhões com 60 anos ou mais, o que representa um aumento de 160%.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera um país envelhecido quando 14% da sua população possui mais de 65 anos. Na França, por exemplo, esse processo levou 115 anos. Na Suécia, 85. No Brasil, levará pouco mais de duas décadas, sendo considerado um país velho em 2032, quando 32,5 milhões dos mais de 226 milhões de brasileiros terão 65 anos ou mais. (SBGG, 2019)

Viver mais e com maior qualidade de vida é a meta, portanto, entender o processo de envelhecimento e as atitudes que podem e devem ser tomadas por familiares, profissionais da saúde e políticas públicas passa a ser fundamental.

São algumas as razões que levam ao isolamento do idoso, aposentadoria, abandono familiar, viuvez, depressão, entre outros. A mudança de padrão de vida e a sensação de perda de utilidade social são gatilhos importantes geradores de depressão e posterior isolamento. A perda do cônjuge pode gerar sentimentos de solidão e sentimentos de desamparo, sendo que muitas vezes são os próprios idosos que se isolam. O abandono por parte dos familiares é um dos que mais afetam este grupo etário, levando por vezes o idoso a severo quadro de depressão. Doenças surgem em razão do quadro depressivo e o ciclo se agrava.

Diferentes modalidades de atenção aos idosos tem surgido nas últimas décadas, dentre elas, a Universidade Aberta para as Pessoas Idosas (Uapi), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Um curso gratuito, de extensão universitária, presente na Unifesp desde 1999, que tem os objetivos de atualizar e reciclar conhecimentos e, principalmente, de promover a inserção social. É nesse contexto que diariamente tenho a possibilidade de conhecer ainda mais este público com o qual venho lidando nos últimos 20 anos.

Ao perguntar sobre solidão ao grupo de estudantes da Uapi/Unifesp, as respostas variam quanto ao nível. A maturidade lhes fez perceber que a seleção de companhia é um fator importante para o bem-estar, portanto não é com “qualquer um” que querem estar e sim com quem lhes acrescenta algo à vida. Acontecimentos durante a vida como um casamento mal sucedido e/ou traição refletem no comportamento atual fazendo com que alguns idosos prefiram viver distantes de uma relação conjugal ou um relacionamento.

O público da Uapi/Unifesp é privilegiado no tocante à companhia familiar. Salvo raras exceções, a maioria mantém um núcleo familiar ativo e aqueles que já não têm mais familiares revelam a fundamental importância da existência de um núcleo social funcional. Atividades físicas, intelectuais, espirituais e culturais formam o contexto.

Importante salientar que aqueles que têm independência física e mobilidade preservada preferem, majoritariamente, morar sozinhos a dividir espaço com filhos, pois a autonomia e a liberdade adquirida vêm se mostrando como uma grande colaboração para a manutenção da longevidade.

Atualmente estão sendo criadas as moradias compartilhadas, chamadas de cohousing, que são uma espécie de condomínio privado onde os moradores possuem suas casas individuais, mas têm por opção partilhar de um espaço comum. Conhecidas como repúblicas, cada grupo estabelece suas regras e alguns modelos apresentam lavanderias, refeitórios e bibliotecas comunitárias; alguns compartilham serviços e meios de transporte. Desta forma é mantida a liberdade de morar em sua própria casa e se privilegiar da companhia dos demais moradores nos espaços coletivos, driblando assim qualquer possibilidade de solidão.

Estamos em atividade intensa na busca por políticas públicas eficazes que façam valer os direitos dos idosos. O Estatuto do Idoso ainda está em sua maioria no papel e não na prática.

O ser humano é um ser social e como tal deve estar inserido na sociedade e respeitado não somente pela idade atingida, mas pela pessoa que é, um ser integral.

(*) Dra. Claudia Ajzen é psicóloga e coordenadora da Universidade Aberta para as Pessoas Idosas (UAPI) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

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