Cultura

Exposição O Grande Vizinho revisitada será aberta em Ipatinga em novembro

Ipatinga receberá em novembro a exposição do projeto fotográfico de Rodrigo Zeferino, um olhar poético sobre a relação da cidade com a indústria

 

IPATINGA – O ensaio fotográfico “O Grande Vizinho”, do artista visual Rodrigo Zeferino, acaba de ser finalizado e será exibido pela primeira vez de forma integral na galeria Hideo Kobayashi, no Centro Cultural Usiminas, em Ipatinga, a partir do dia 13 de novembro.

A série fotográfica que ganhou visibilidade nacional, após receber o Prêmio FCW de Arte 2016/2017, oferecido pela Fundação Conrado Wessel, em São Paulo, é um olhar poético sobre a relação de Ipatinga com a usina siderúrgica Usiminas, que ocupa o centro geográfico da cidade. Mas para esta exposição, o artista mineiro apresenta novidades em relação ao trabalho original: durante os últimos quatro meses ele circulou pela fábrica e interpretou em imagens o visual intrigante de seu interior.

CENÁRIO

O fotógrafo relata que, com a publicação das primeiras fotografias de “O Grande Vizinho” na imprensa e seu compartilhamento nas redes sociais, em 2017, ele começou a receber o feedback de moradores da cidade com suas impressões sobre o trabalho. “A maioria das pessoas que residem na região convivem diariamente com um horizonte ocupado por chaminés, gasômetros e torres, e com o tempo o olhar se anestesia, tudo isso se torna comum. O retorno que recebi dos moradores de Ipatinga, e também de outras cidades siderúrgicas, foi o que estimulou a voltar meu olhar para dentro da usina e fazer minha leitura poética do interior de uma empresa deste porte”, explica.

MUDANÇA NO OLHAR

Ele fala também da satisfação de ver seu trabalho sensibilizando as pessoas: “é o objetivo de todo artista, tocar o espectador de alguma forma, causar uma mudança, ainda que mínima, no seu olhar. Muita gente comentou comigo que, depois de ver as fotos, passou a entender a paisagem da cidade de forma diferente, observando sua peculiaridade”, completa.

Ainda de acordo com o artista, foi após uma longa negociação com a empresa, que é a patrocinadora do projeto por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, que ele recebeu autorização para fotografar com “liberdade criativa” e circular por todos os locais desejados. Ele destaca que o objetivo não é retratar os processos com a fidelidade em que acontecem, mas mostrar uma visão descontruída dos ambientes. “Muitas vezes eu descontextualizo a cena, seja pela manipulação da luz, pelo recorte, pelos recursos que a fotografia permite, e ressignifico os elementos presentes. Tento transformar as grandes estruturas, como panelas de aço, tubulações ou altos-fornos, em criaturas autônomas, pouco reconhecíveis, mas estranhamente belas”, conta.

VÍDEOS E ESCULTURAS

Além das 35 fotografias, da primeira e da segunda etapas do projeto, também serão exibidos vídeos e esculturas. Esta é a primeira vez que o artista se arrisca na criação de objetos tridimensionais. “Ao tomar contato com alguns dos processos de produção do aço, notei uma riqueza visual nos movimentos das máquinas e percebi que precisaria do vídeo para construir o discurso visual, a fotografia somente não daria conta”, explica.

Sobre as esculturas, na verdade tratam-se de objetos gerados espontaneamente nos processos siderúrgicos e que, quando retirados de seu ambiente natural, podem assumir significados múltiplos. “A ideia é também fazer as pessoas refletirem sobre nossas formas de consumo. Falamos muito sobre ecologia, sobre os efeitos da nossa presença no planeta, mas continuamos vivendo nossas vidas da mesma forma destrutiva de sempre. Não faço aqui uma crítica às grandes corporações, e sim uma observação sobre os sacrifícios que fazemos para realizar nossos sonhos de metal”, finaliza.

PRIMEIRO, IPATINGA

Zeferino, que já exibiu seus trabalhos em várias cidades do Brasil e no exterior, fala da importância de mostrar este ensaio primeiramente em Ipatinga. “Eu nasci aqui e aqui desenvolvi este trabalho. Por isso deduzo que o público local vai olhar pra ele de uma forma que nenhum outro conseguirá”.

O projeto também prevê a realização de oficinas de fotografia com os artistas visuais Nilmar Lage, de Ipatinga, e Alexandre Sequeira, de Belém (PA), que acontecerão durante o período da exposição. A curadoria da exposição é do artista belorizontino Pedro David.

PROJETO ORIGINAL

O título do trabalho é uma referência à famosa novela de George Orwell. Na sociedade distópica descrita pelo autor inglês no livro “1984”, todos os cidadãos são constantemente seguidos pelos olhos onipresentes do Grande Irmão, figura autoritária que representa o governo.

Experimente a sensação de circular por Ipatinga, no Vale do Aço mineiro, cidade natal do fotógrafo e artista Rodrigo Zeferino. Fundada no icônico ano de 1964, a Ipatinga surge para abrigar uma usina siderúrgica, então estatal, que já estava funcionando na ocasião da emancipação do município. Intrigante, porém, é o fato de a cidade ter sido construída em torno da planta, circulando todo o seu perímetro. As torres, chaminés e outras estruturas da usina são avistadas de qualquer ponto da cidade original, ela está sempre presente na paisagem.

O que Zeferino faz é registrar essa peculiaridade na paisagem, onde prédios, casas e repartições públicas se misturam a altos-fornos, gasômetros e outras grandes estruturas.

A população tem papel determinante no trabalho. Na construção do ensaio, o fotógrafo solicitou que moradores e funcionários de estabelecimentos posassem para as fotos. Para evidenciar a condição de proximidade entre cotidiano social e atividade siderúrgica, Zeferino posicionava no primeiro plano da imagem as janelas e sacadas das edificações ocupadas por essas pessoas, sempre num raio de 2 km da indústria.

NOITE

Já a escolha por fotografar à noite traz as motivações pessoais de quem cresceu ouvindo uma antiga lenda urbana. Ainda há quem acredite no mito de que, enquanto a cidade dorme, a fábrica lança na atmosfera quantidades maiores de resíduos, sob o pretexto de que menos pessoas estariam observando.

Ainda viva no imaginário popular, essa quimera do “céu escarlate”, de acordo com o fotógrafo que há décadas observa o fenômeno, é na verdade fruto da ilusão óptica causada pela refração e reflexão das luzes que iluminam ambas, usina e cidade, gerando uma aura de tons quentes sobre o perímetro urbano, fundindo fumaça, vapor e nuvens.

SERVIÇO

Exposição “O Grande Vizinho”

Abertura: 13/11 terça-feira

Local: Galeria Hideo Kobayashi – Centro Cultural Usiminas.

Você também pode gostar

PHP Code Snippets Powered By : XYZScripts.com