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CPI da Funai criminaliza índios, aliados e até arcebispo

BRASÍLIA – Em uma reunião marcada por discussões tensas, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Fundação Nacional do Índio (Funai) e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) 2 aprovou o relatório do deputado Nilson Leitão (PSDB-MT). O documento de 3.385 páginas pede, entre outros pontos, o indiciamento de mais de 90 pessoas, entre lideranças indígenas, religiosas, antropólogos, procuradores da República, técnicos da Funai e do Incra e defensores dos direitos dos povos originários, por supostos crimes cometidos durante o processo de demarcação de terras indígenas.

DEMARCAÇÃO

O relatório também traz, entre as proposições, a reanálise da demarcação de terras indígenas e dos procedimentos administrativos em andamento no Ministério da Justiça. O documento pede ainda a proposição de um projeto de lei para regulamentar o Artigo 231 da Constituição, que trata da demarcação de terras indígenas.
Ainda faltam votar os destaques. Em razão do início da Ordem do Dia em plenário, o presidente do colegiado, deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), suspendeu a sessão. "Ela está suspensa e voltará com a votação do segundo destaque", disse.

CRÍTICAS

Desde ontem (16), quando teve início o processo de discussão que antecede a votação do parecer, os deputados da oposição tentaram adiar a votação e criticaram duramente o relatório. O texto, segundo eles, atende aos interesses da bancada ruralista e age com parcialidade, com a intenção de “criminalizar os índios e seus apoiadores, especialmente aqueles que atuam pela demarcação dos limites das áreas indígenas”, disse o deputado Nilto Tatto (PT-SP). Após a apresentação do parecer do relator, a oposição tentou novamente adiar a votação, por meio de requerimentos de adiamento. Entretanto, todos foram rejeitados.
“Por tudo o que acompanhamos aqui fica claro que o relatório será aprovado por essa comissão, o que é muito triste”, disse a deputada Eliziane Gama (PPS-MA), que ao lado de Tatto apresentou voto em separado com críticas ao relatório. “O texto do relator tem encaminhamentos preocupantes de normas legais, sem obedecer critérios. Vamos questionar a constitucionalidade desse relatório. Entendemos que não há um embasamento legal e constitucional suficiente para entender que este relatório seja legal”, acrescentou.

“FALHAS”

No discurso de defesa de seu parecer, Nilson Leitão admitiu que o relatório pode ter falhas e é “discutível”. Mas, negou que tenha a intenção de indiciar alguém e argumentou que “a CPI não indicia ninguém”, apenas encaminha procedimento de ação administrativa para que os órgãos competentes possam tomar as providências sobre a conduta suspeita dos investigados.

ATÉ MORTO É INDICIADO
Depois de críticas da oposição, Leitão afirmou que vai retirar da lista de indiciados o nome de um servidor que já morreu. O relator disse ainda que, ao contrário da proposta inicial em que havia a possibilidade de extinção da Funai, seu parecer recomenda a reestruturação do órgão. A sugestão inicial era pedir à Presidência da República a criação de uma Secretaria Nacional do Índio, que assumiria as atribuições da Funai.
Leitão retirou também do relatório a sugestão de indiciamento do presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho, mas manteve a sugestão do indiciamento do secretário-executivo do Cimi, Cléber Cezar Buzatto, e do conselheiro Roberto Antonio Liegbott. Os pedidos atingem pessoas que atuam nos estados da Bahia, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
A sessão foi marcada por troca de acusações e ofensas entre os deputados oposicionistas e integrantes da chamada bancada ruralista. O deputado Edmilson Rodrigues (PSOL-PA) se exaltou após ter tido a palavra interrompida pelo presidente da comissão, deputado Alceu Moreira. Aos gritos, Rodrigues pediu que seu tempo fosse respeitado de acordo com o regimento, o que motivou novo bate-boca entre os membros da comissão.

CPI
A CPI da Funai foi instalada sob justificativa da necessidade de investigação de casos de fraudes e desvios ocorridos no processo de demarcação de terras conduzido pela Funai e o Incra. A comissão é composta, em sua maioria, por integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária, a chamada bancada ruralista.
O texto também é fortemente criticado por entidades que atuam na defesa dos direitos indígenas. As lideranças comunitárias avaliam que o pedido de indiciamento é equivocado e visa criminalizar os agentes que atuam de forma contrária aos interesses econômicos dos ruralistas. “A votação deste relatório coincide com a violência crescente contra povos indígenas, quilombolas e reforma agrária. Nos últimos tempos temos visto massacres de trabalhadores rurais no Mato Grosso, aos índios Gamela no Maranhão, a líderes quilombolas em Minas Gerais e no Pará”, disse a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP).

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