Cidades

O caixeiro viajante que fez história em Ipatinga

Integrantes da comissão de emancipação, entre eles Walter Sales (terceiro à esquerda), durante o primeiro encontro com o governador Magalhães Pinto

IPATINGA – O olhar empreendedor de Walter de Lima Salles em 1958 foi imprescindível para que ele largasse a profissão de caixeiro viajante, uma espécie de representante comercial, para se aventurar no distrito de Ipatinga.
Na visão de Walter, o lugarejo não se desenvolveria enquanto pertencesse a Coronel Fabriciano. A construção da indústria já movimentava a economia do distrito e em busca de novas oportunidades, o comerciante foi a Governador Valadares e comprou cinco máquinas de costura, cinco bicicletas e cinco rádios.
O pioneiro foi protagonista de dois encontros com o então governador de Minas, Magalhães Pinto, que já sabia dos anseios dos comerciantes locais em emancipar o distrito. Confira um pouco da história do empresário que contribuiu para o desenvolvimento de Ipatinga e região:

DIÁRIO POPULAR – Como foram todas as movimentações políticas para que Ipatinga e Timóteo se desmembrassem de Coronel Fabriciano?
WALTER SALLES – Fiz parte da comissão de emancipação de Ipatinga. Todos os dois distritos, Ipatinga e Timóteo, pertenciam a Coronel Fabriciano, que era a Comarca. Quando nós fizemos o pedido, o primeiro foi vetado pelo Magalhães Pinto, porque o Ciro Cotta, prefeito de Fabriciano, era da UDN e o Magalhães não queria incomodá-lo, tirar as duas cidades que davam renda para todo município. Foi quando, então, a convite da Acesita veio a Belo Horizonte Carlos Lacerda, governador do Rio de Janeiro, que era um dos pretensos candidatos à presidência da república. Quando eu vi o Ciro Cotta, prefeito de Fabriciano, abraçado com o Carlos Lacerda, levei o jornalzinho para o Magalhães. Essa reunião ocorreu em 1963. E a emancipação em 1964.

DIÁRIO POPULAR
– Quais eram os outros pioneiros que se juntaram a essa movimentação?
WALTER SALLES – Jaci Lacerda, Manoel Simão e Elias Correa. Esses foram os três companheiros que foram comigo no gabinete do governador. Mostrei para ele o jornal. E ele fez a carta dizendo que emanciparia Ipatinga e Timóteo.

DIÁRIO POPULAR – Quais eram as condições da cidade nesta época?
WALTER SALLES – Fomos de ônibus. O distrito era industrializado. Já vivia muito bem, com patrimônio, rico em termo de arrecadação, razão pela qual Fabriciano não queria perder os distritos de Timóteo e Ipatinga.

DIÁRIO POPULAR – O senhor acha que os recursos eram bem aplicados naquela época?
WALTER SALLES – Não eram. Nós reclamávamos disso.

DIÁRIO POPULAR – Quando o senhor veio para Ipatinga?
WALTER SALLES – Cheguei em 1958, estava no Rio de Janeiro. Era caixeiro viajante. E eu morava em Governador Valadares. Então, quando vi a notícia que Ipatinga ia instalar a maior siderúrgica da América Latina, decidi vir para Ipatinga. Eu estava em um hotel perto do Rio de Janeiro, quando um colega meu me mostrou: “Olha Walter, tem duas notícias lá da sua região. Uma boa e uma ruim, qual você quer primeiro?” A ruim era uma tromba d’água que tinha caído em Coronel Fabriciano e a boa era o início da construção da Usiminas. E falei: vamos embora amanhã. Quando foi no dia seguinte vim embora para Valadares. No outro dia, peguei o trem e vim para Fabriciano. Quando desci encontrei um conhecido, Rufino da Silva Neto, que era prefeito em Fabriciano e disse que ia me ajudar.
Mas fui para Ipatinga, onde aluguei um cômodo e voltei para Valadares. Depois trouxe de Valadares cinco máquinas de costura, cinco bicicletas e cinco rádios e despachei para Ipatinga. Recebi a mercadoria e botei uma faixa: Casa das Máquinas. Comecei assim.

DIÁRIO POPULAR – Por que construir a rodoviária?
WALTER SALLES – Não tinha local para os ônibus pararem.

DIÁRIO POPULAR – Quanto tempo foi suficiente para o senhor melhorar sua situação e construir a rodoviária?
WALTER SALLES – A rodoviária foi logo em seguida. Eu vi essa necessidade. Nessas alturas Ipatinga já era cidade. Eu fiz uma carta a Fernando Coura, prefeito de Ipatinga na época, perguntando se havia interesse da prefeitura na construção da rodoviária. No primeiro terminal só cabiam três ônibus. Então foi ali que começou. Aqui [na atual rodoviária] era uma serraria. Vendi a outra, comprei aqui e passei a rodoviária para cá.

DIÁRIO POPULAR – O senhor não quis entrar para a vida política?
WALTER SALLES – Ser político não é meu ramo. Mas eu apoio quando são pessoas dedicadas ao município. Assim eu acho que tenho que dar minha sugestão. Estamos satisfeitos com o governo da prefeita [Cecília Ferramenta]. Pessoa séria e bem intencionada com o município.

DIÁRIO POPULAR – Para uma cidade que tem menos de 50 anos, qual sua contribuição para que Ipatinga estivesse hoje no patamar de desenvolvimento em que ela está?
WALTER SALLES – Eu fiz minha parte. Um comerciante que muda para um local que pretende ser o lugar onde vai morar pelo resto da vida, ele tem a obrigação de cuidar e ajudar no desenvolvimento daquele local. E eu dei a parte que me cabia, que era possível fazer. Fui presidente da Associação Comercial, continuo lá como membro do Conselho e graças a Deus temos tido bons companheiros na Aciapi.

DIÁRIO POPULAR – Além da emancipação e construção da rodoviária, em que mais o senhor contribuiu?
WALTER SALLES – Os primeiros telefones fomos nós que instalamos na cidade. Nós que construímos a telefônica, que ficava ao lado da atual Estação Memória.

DIÁRIO POPULAR – Nos próximos 50 anos, o que seria importante para a cidade continuar crescendo e se desenvolvendo?
WALTER SALLES – A participação da população, dos comerciantes. Todos devem participar e ter interesse no desenvolvimento da cidade.

DIÁRIO POPULAR – Qual a análise que o senhor faz da atual situação da Usiminas? Há boatos de que a Usiminas será vendida.
WALTER SALLES – Olha, esse boato chegou ao nosso conhecimento e nós achamos muito ruim. A Usiminas é a mãe da comunidade. Sem ela aqui o comércio de Ipatinga cai muito. É ela que traz o desenvolvimento econômico.


A primeira rodoviário na rua Belo Horizonte, onde só cabiam três ônibus

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