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Mulher, atleta e vencedora: conheça a trajetória da atleta Lucimar Moura

IPATINGA – No dia Internacional da Mulher (8), a Usipa compartilha a história da atleta Lucimar Aparecida de Moura: primeira usipense medalhista olímpica. A velocista de 42 anos conta sua trajetória, dificuldades, conquistas e histórias inesquecíveis, relembrando o amargo quarto lugar nas Olimpíadas de Pequim. Ela também descreve o seu momento de redenção, quando será agraciada com a medalha olímpica, nove anos após a prova.

Como você começou no Atletismo?
Sempre pratiquei esporte! No Atletismo comecei aos 16 anos por meio da escola. Na ocasião, a Usipa realizava um “intercâmbio”, para revelar atletas. Algumas escolas do Vale do Aço foram competir no clube. Disputei a prova de 100m, descalço e sem noção nenhuma sobre o esporte, e ganhei! A professora Marlene Lourenço (auxiliar técnica da Usipa naquela época) gostou do meu desempenho e me convidou para treinar. Na semana seguinte, eu já estava praticando atletismo no clube.

Como era a sua rotina na Usipa?
No início, eu não sabia muito bem como era o esporte e não tinha muitas obrigações de treinamento. Ao passar do tempo, eu evoluí e tive um apoio e incentivo muito grande da Marlene. Ela sempre me dizia “Olha… se você ganhar, eu te dou uma meia” ou então “Ah, se você ganhar, eu te dou um tênis”. Com três meses de Usipa, eu fui vice-campeã Brasileira, em São Paulo. Já com seis meses, eu fui ao Equador e também fui vice-campeã, só que Sul-americana.

Em que prova você começou?
Eu fazia de tudo! Salto em distância, 100m, 200m, revezamento 4x100m, lançamento de dardo. O que fosse necessário para ajudar a equipe. Mas as minhas especialidades sempre foram 100m, 200m e revezamento 4x100m.

E a rotina, como era?
Eu estudava de manhã, chegava em casa para almoçar, lavava vasilha e corria para Usipa! Nunca deixei de cumprir todas as minhas obrigações, como filha, pessoa e atleta. Meu pai sempre me incentivou e os meus irmãos também. Tenho duas irmãs e quatro irmãos, a minha mãe já faleceu. Minha família sempre praticou esportes, meu pai praticava malha na Usipa e os meus irmãos jogavam futebol.

O que as pessoas pensavam de você naquela época?
Meus amigos e toda a vizinhança ficavam muito emocionados. Quando eu fui ao Equador, eu andei de avião pela primeira vez, lembro-me de ter até olhado no mapa para saber onde ficava o país. Tive um apoio muito grande de todos, acho que isso foi um grande incentivo para mim.

Que tipo de apoio você teve nessa jornada?
Graças a Deus, meu pai sempre me ajudou e nunca permitiu que nada faltasse dentro de casa. Tive um apoio muito grande da Usipa! Assim que me destaquei nas competições, consegui um bom patrocínio, do José Osmir de Castro. Foi ótimo! Eu usava o dinheiro para comprar uma fruta, um suplemento, etc., e isso me possibilitou ter uma melhor qualidade no treino.

Quem foi o seu grande mentor no Atletismo?
Foi o Sildemar Venâncio, o “Biga”! Atualmente, ele é coordenador de Atletismo da Usipa e foi meu segundo técnico no clube. Um grande treinador! Passou muita experiência para mim e me aconselhou. Com os ensinamentos dele, eu vivi uma das minhas melhores fases e consegui bater o recorde sul-americano.

E a oportunidade de competir por outro clube, como surgiu?
Da Usipa, eu fui pro Rio. Era um intercâmbio com o Club de Regatas Vasco da Gama, treinava na Usipa e ia competir no Vasco, mas não deu muito certo. Após esse processo, eu fiquei sem clube e depois, recebi o convite do BM&F Bovespa, em 2003.
Cheguei a São Paulo com um pensamento único “Quero ganhar e ter uma carreira brilhante”. O Biga sempre disse “Você tem que ser boa para sua família, na sua escola e sua vizinhança”. Treinei, tive bastante persistência, me lesionei e morava longe da família. Nunca foi fácil, até porque a gente nunca coloca fé em nós mesmos. Mas eu nunca descartei a hipótese de ir a uma Olimpíada.

Como foram os seus momentos olímpicos?
Na minha primeira Olimpíada, em Atenas (2004), passou um filme na minha cabeça: Eu saí do Vale do Aço, em Acesita, e treinei muito na pista de carvão da Usipa. Agora eu sou atleta olímpica! Naquela época, eu competi na prova de revezamento 4x100m. A equipe não se classificou para a final, mas a Confederação Brasileira de Atletismo – CBAt notou que tínhamos potencial para alcançar um melhor resultado. Com o apoio da confederação, nós participamos de várias competições e conseguimos bons rendimentos nos mundiais. Treinamos fora do país e demonstramos uma grande evolução para os Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008.

Como foi o dia em que você viu a medalha de bronze escapar?

Em Pequim, nós chegamos muito bem. Já tínhamos a experiência de uma Olimpíada. Corremos bem na fase classificatória. O treinador disse que se continuássemos desse jeito, nós poderíamos conquistar uma medalha. No dia da prova foi bem apreensivo, lembro que equipe fazia tudo junto (tomar café, almoçar e passear). O momento mais marcante na hora da prova foi quando eu estava na raia sete e entreguei o bastão em primeiro lugar. No fim, acabamos em quarto. Foi frustrante! Afinal, o quarto lugar é marcado por você ter perdido a medalha de bronze. Infelizmente, ninguém pensa que a gente ficou entre as quatro melhores. Foi um dia triste, realmente, não foi fácil.

Oito anos após as Olimpíadas você teve a chance de sonhar com a medalha. Como você recebeu essa notícia?
Eu estava em casa e o meu amigo Sandro, que também foi para a Olimpíada, disse que estava correndo um boato “Parece que a Rússia foi pega no dopping”, disse ele. Eu até li a matéria, mas naquele momento, eu não dei muita importância. À medida que as verdades foram surgindo, eu me interessei mais sobre o fato. Afinal, o comitê esportivo tinha ficado mais rigoroso. Após muita investigação do comitê e apreensão da minha parte, eu recebi a notícia: Você é uma medalhista olímpica! Fiquei extremamente feliz quando confirmaram que eu ganhei a medalha de bronze, mesmo sendo oito anos depois da competição.

Você acha que poderia ter sido diferente se tivesse conquistado o terceiro lugar naquele dia?
A gente poderia ter sido mais valorizada na mídia, ter vários contratos e com um reconhecimento maior. Talvez, eu não teria dado uma pausa na carreira para engravidar. Provavelmente, teria corrido mais e tentando ir a outras Olimpíadas.

Quais conquistas são memoráveis para você?
Tive uma carreira de grandes realizações! Fui campeã mineira, vice-campeã mundial universitária, brasileira Sub-16 e Adulto. Além disso, conquistei a medalha de prata, correndo os 200m nos Jogos Pan-Americanos de Winnipeg, no Canadá. Sou ex-recordista sul-americana e brasileira nos 100m, 200m e revezamento 4×100. Estive entre as 12 melhores mulheres do ranking mundial, na prova de 100m rasos. E agora, para coroar, ganhei a medalha olímpica!

Quando decidiu se aposentar?

Eu engravidei e após o período de gestação, eu estava com 36 anos. Ainda estava disposta a treinar. Meu técnico disse que se eu tivesse engravidado com 23 até uns 30 anos, eu teria voltado melhor. Com o tempo, eu senti a diferença. Sempre estive nas primeiras colocações. Mas em determinado momento, eu vi as meninas mais novas me ultrapassando e ganhando competições. Eu estava para trás. A família estava toda em Minas Gerais e eu permanecia em São Paulo. A cabeça queria que eu corresse, mas as pernas não obedeciam mais. Todos esses fatores me ajudaram a tomar a decisão de aposentar. Foi fácil! Eu queria, mas não admitia. Com certeza seria ruim parar por obrigação, eu parei por uma vontade natural. Aposentei do Atletismo em 2013.

E hoje, o que está fazendo?
Estou como dona de casa e cuidando da minha filha. Quando meu corpo pede, eu vou à Usipa e treino à noite. Faço um treinamento funcional passo a passo, com a Euzinete Reis (técnica de Atletismo na Usipa). Foi uma batalha, lutei bastante! Hoje eu concretizei o que eu almejava: ser uma grande atleta! Além disso, sou medalhista olímpica. Confesso que não é a mesma coisa… receber a medalha nove anos depois. Não tive aquela emoção de dar uma volta olímpica. Mas agora, a minha vida está tranquila e tenho colhido bons frutos desse resultado. No dia 29 de março, eu participarei do Prêmio Brasil Olímpico, no Rio de Janeiro, para receber a tão sonhada medalha.

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