Cidades

Jovem de 15 anos morre sem atendimento médico

Marina Rosa e Waldemar José acreditam que a morte do filho teria sido evitada se não tivessem negado atendimento no Hospital Municipal    (Crédito: Nadieli Sathler)

 

IPATINGA – A morte de Eduardo Rosa dos Santos, de 15 anos, morador do município de Ipaba, pode ser o primeiro caso concreto de omissão de socorro no Hospital Municipal Eliane Martins, desde que o governo Robson Gomes (PPS) cortou o pagamento de horas extras, necessárias para suprir a demanda de atendimentos na unidade.
A mãe do adolescente, Marina Rosa dos Santos, de 58 anos, e o pai Waldemar José dos Santos, 73 anos, procuraram a reportagem do DIÁRIO POPULAR na tarde de ontem e contaram detalhes do óbito do filho.
“Ele começou a passar mal numa quinta-feira (12), reclamava de dor na cabeça e corpo. Isso sem falar na febre alta. Levei na farmácia e suspeitaram de dengue. Comprei Tylenol e demos o remédio por dois dias, só que ele continuava ruim”, falou a mãe.
Ao constatar que o quadro febril permanecia, a família – residente no bairro São José – decidiu trazer Eduardo de ônibus ao Hospital de Ipatinga no início da noite de sexta (13).
Waldemar disse que chegou ao pronto-socorro por volta das 19h, e após preencher uma ficha com os dados do filho, aguardou por quase uma hora. Só que, ao ser chamado, foi informado por um funcionário da unidade que o adolescente não poderia ser atendido.
“Liguei ainda para saber se tinha um carro da Prefeitura para nos buscar, só que me negaram. Tive que passar a noite inteira na recepção porque não tinha dinheiro para voltar de táxi para o Ipaba, e depois das 22h não tinha mais ônibus”, informou.
O pai contou que o filho passou a noite deitado em seu colo chorando de dor e com febre. Ainda sem receber atendimento, na manhã de sábado, os dois saíram do Hospital por volta das 7h e voltaram para o Ipaba.

NOVA OMISSÃO
Sem se alimentar desde que adoeceu, o quadro de Eduardo só piorava. Marina relatou que o filho não tinha forças para comer e só aceitava água e soro. Durante o final de semana, apareceram várias manchas pelo corpo do adolescente.
“Só de encostar ele gritava, não aguentava aquele sofrimento. Então voltei com ele no domingo (15) cedo para Ipatinga. Uma vizinha nos levou de carro até o pronto-socorro e novamente fizemos uma ficha e aguardamos. Disseram que meu filho tinha dengue e que devia voltar para casa, que as dores iam passar”, lembrou a dona-de-casa.
A insistência da mãe de Eduardo não conseguiu demover os funcionários da unidade, e mesmo assim ela passou a tarde toda pedindo para que examinassem seu filho. Só que mais uma vez o jovem teve que voltar para o Ipaba sem receber atendimento médico.
“Eduardo estava tão fraco que não aguentava andar, tive que esperar a ambulância da Prefeitura do Ipaba, que veio nos buscar depois das 21h. Chegamos em casa e foi mais uma noite de sofrimento, de ver meu filho naquele estado”, lamentou.

NEGLIGÊNCIA
Decididos a levar o filho a um médico, na segunda-feira (16), Waldemar foi até uma Unidade de Saúde no município de Ipaba e pediu que um motorista da unidade os levasse novamente para Ipatinga, pois ele não estava conseguindo levantar da cama.
“O enfermeiro me falou para levar o Eduardo no posto porque tinha médico naquele dia. Quando pedi para buscá-lo no carro, zombaram de mim, tinha dois carros e uma ambulância, mas não foram lá em casa”, detalhou o aposentado.

MÁRCIO CUNHA
Já sem muita alternativa, o pai pediu que um vizinho fosse com ele até o Hospital Márcio Cunha. Waldemar disse que o filho deu entrada na unidade e, ao passar pela triagem, a enfermeira constatou que a pulsação do adolescente estava muito baixa.
“Ele foi internado assim que chegamos. Colheram sangue para exame e colocaram no soro. Eduardo nem tinha mais força para gritar, só gemia de dor. Fiquei com ele no sexto andar, mas às 14h o quadro piorou e levaram ele para a UTI”, disse.
Por volta das 15h, a família foi comunicada pelo serviço social da Fundação São Francisco Xavier que Eduardo faleceu. A suspeita é de que o adolescente tinha meningite, tanto que o médico receitou para toda a família Rifampicina.
O medicamento é usado em pacientes que tiveram contato com portadores de meningite meningocócica.

JUSTIÇA
“O que aconteceu com meu filho foi uma injustiça. Podiam pelo menos ter atendido. Não podem fazer isso com um ser humano. Todo mundo ficou horrorizado com o que aconteceu”, justificou Waldemar.
Passada uma semana desde a perda do filho, os pais decidiram contratar um advogado para processar a Prefeitura de Ipatinga. Eles vão alegar que houve omissão de socorro a Eduardo nas duas vezes em que estiveram no Hospital Eliane Martins.
“Meu filho era um menino obediente e estudioso, ele podia estar vivo e forte. Podiam ter evitado a morte dele. Alguém tem que ser punido para que não aconteça com outras pessoas”, finalizou Marina.

PRONUNCIAMENTO

A Prefeitura de Ipatinga informou, através de nota enviada na noite de ontem, que lamenta a perda da família. E ainda que está fazendo o levantamento do caso e vai se pronunciar nesta terça-feira.

Promotor sugere convocar aprovados em concurso
Ipatinga
– Durante novo encontro realizado na tarde de ontem (23) pela Promotoria de Saúde, na sede do Ministério Público, no bairro Cariru, o promotor Walter Freitas voltou a tratar da situação do Hospital Municipal Eliane Martins.
A reunião foi realizada com o secretário municipal de Saúde, Wagner Barbalho, o diretor da unidade hospitalar Eclair Fensk e representantes da Fundação São Francisco Xavier.
Foram apresentados detalhes sobre os entendimentos entre o município e a Secretaria Estadual de Saúde, que se dispôs a realizar repasses para a Prefeitura de Ipatinga no valor de R$ 1,5 milhão para amenizar a situação.
Entretanto, a promotoria alertou que a legislação eleitoral pode impedir que o socorro financeiro aconteça antes do pleito de outubro. A situação na unidade vai se agravar ainda mais com a dispensa de 24 técnicos que foram contratados irregularmente.
“Essa dispensa irá reduzir ainda mais o quadro. Discutimos a possibilidade da Administração Municipal efetuar a contratação de técnicos já aprovados no último concurso, que está inclusive homologado, o que deverá ser avaliado nos termos da Lei de Responsabilidade Fiscal. O município irá encaminhar informações por escrito à promotoria até quinta-feira”, contou.
Também foi abordada a necessidade de se prestar esclarecimentos à população, quanto ao encaminhamento hospitalar, visto que tanto o Hospital Municipal e Hospital Márcio Cunha realizam uma triagem por risco do paciente (protocolo de Manchester).
“O secretário municipal de saúde declarou que irá priorizar os atendimentos emergenciais. Por sua vez, o Márcio Cunha não tem estrutura para absorver todo o atendimento. Assim, é importante que a população seja informada quanto às opções, em especial eventual atendimento não emergencial realizado nas unidades básicas de saúde”, pontuou.

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