Cidades

Expedição Piracicaba fecha primeiro ciclo do trabalho

Em 11 dias de viagem, equipes percorreram todas as cidades da bacia do Rio Piracicaba colhendo amostras, histórias e disseminando a conscientização

Depois de 11 dias de jornada e 21 cidades visitadas, a Expedição Piracicaba alcançou em 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, a foz do Rio Piracicaba, em Ipatinga, no Vale do Aço, onde ocorre o encontro com o Rio Doce. Foram descidos 241 quilômetros do leito do rio, mas, tendo-se em conta o percurso dos veículos, a distância percorrida chegou a aproximadamente 1.500 quilômetros. Em linhas gerais, o que se viu foi um rio com belas paisagens engolidas por problemas como lançamento de esgoto doméstico e efluentes industriais, lixo, desmatamento, erosão e assoreamento, além de vários relatos de baixa no volume de água. O objetivo principal do projeto é traçar um diagnóstico completo e inédito da Bacia Hidrográfica do Rio Piracicaba.

Integrantes da expedição que percorreram o rio durante 11 dias

A Expedição Piracicaba é uma iniciativa do jornal Tribuna do Piracicaba – A Voz do Rio em parceria com o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Piracicaba (CBH-Piracicaba) e a Universidade Federal de Itajubá (Unifei) – Campus Itabira, responsável pela coordenação científica da empreitada, além de contar com o apoio do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam). Cabe ressaltar a participação ativa, durante os 11 dias de expedição, de militares do 11º Batalhão de Bombeiros Militar e da 12ª Companhia de Polícia Militar de Meio Ambiente, ambos localizados em Ipatinga, além da Polícia Militar de Minas Gerais.

AMOSTRAS

Foram coletadas 112 amostras de água e 28 amostras de sedimentos, trabalho realizado em 28 pontos da bacia hidrográfica. Os marcos de coleta foram os mesmos da Expedição Piracicaba 300 Anos Depois, ocorrida em 1999, isso para que os resultados sejam comparados e para que seja traçada uma linha evolutiva do equilíbrio da bacia. No entanto, há 20 anos, foram analisados 9 parâmetros de qualidade da água, ao passo que agora 37 parâmetros serão verificados, incluindo-se aqueles estudados em 1999.

Amostras de água foram coletas em diversos pontos para análise dos níveis de poluição

“Com o resultado dessa pesquisa, que deve ser publicado no primeiro semestre de 2020, avaliaremos a qualidade da água em pontos que foram feitos exatamente há 20 anos. Além de se repetirem os parâmetros de 1999, aumentamos quantitativamente e qualitativamente essas variáveis, fizemos coletas de sedimentos de fundo de rio e sessões batimétricas, medindo a profundidade dos cursos d’água. Assim teremos um estudo mais caracterizado e acentuado da realidade do rio”, avalia José Augusto Gonçalves, professor da Unifei e coordenador técnico-científico da expedição.

DESDOBRAMENTOS

A Expedição Piracicaba se desdobrará em diversos conteúdos e ações, além da produção do relatório técnico-científico. Serão publicadas edições do Tribuna do Piracicaba dedicadas à iniciativa, uma revista com foco nas cidades visitadas e um livro-diário da jornada, em conjunto com o lançamento de duas produções audiovisuais e da organização de uma exposição fotográfica itinerante ao longo da bacia.

A finalização e apresentação desses produtos estão previstos para o segundo semestre de 2019 e primeiro semestre de 2020.

ANÁLISE INÉDITA

Um viés inédito da pesquisa é a análise, dentre os 37 parâmetros, de 13 microcontaminantes, compostos que nunca foram estudados no Piracicaba ou afluentes. “Os microcontaminantes são uma preocupação em função do aumento do consumo de medicamentos, cosméticos e de diversos tipos de plásticos. Tudo isso está indo para o rio através do lançamento de esgoto e de efluentes industriais sem tratamento. É urgente avaliarmos a presença desses compostos na bacia do Rio Piracicaba”, ressalta Diego Lima, doutor em engenharia ambiental e um dos pesquisadores da expedição.

Além da qualidade da água, a Expedição Piracicaba promove estudos de amostras de sedimentos recolhidos do leito, matéria que guarda a história do rio, como no caso da identificação de metais pesados, e avaliação geoespacial do uso e ocupação do solo. Fotos de satélites de períodos anteriores estão sendo comparadas com fotos atuais e com a inspeção visual feita ao curso da iniciativa, com o intuito de identificar pontos de desmatamento, surgimento de novos empreendimentos industriais e comerciais e avanço da mancha urbana, dentre outras variáveis.

“Um bom uso e ocupação do solo seria aquele que mantivesse matas ciliares ao longo do rio, pois elas funcionam como um filtro e impedem que sedimentos e matéria orgânica alcancem o curso d’água. Outro ponto importante são as regiões de recarga dentro da bacia, caso dos topos de morro, que devem estar protegidos”, explica Eliana Maria Vieira, professora da Unifei e especialista em geoprocessamento, também integrante do corpo técnico da expedição.

À MARGEM DO RIO

Eliana Vieira acrescenta que a maioria das cidades se desenvolve às margens do rio, área que também costuma ser a mais fértil e mais cobiçada para diversos usos. São características que aumentam a pressão sobre o curso d’água.

A equipe técnico-científica da Expedição Piracicaba contou com 29 membros, entre professores, graduandos e mestrandos da Unifei e especialistas convidados. Devido às normas internacionais que regem esse tipo de estudo, os pesquisadores não seguiram em conjunto com os demais integrantes da expedição, pois as amostras precisaram ser levadas diariamente para os laboratórios da universidade em Itabira, o que demandou uma logística especial de deslocamento.

MOBILIZAÇÕES

Todas as 21 cidades visitadas pela Expedição Piracicaba preparam recepções calorosas às equipes. Além da pesquisa, a iniciativa trabalhou a mobilização social em prol da recuperação da bacia. A participação foi intensa, muitas dúvidas foram levantas, debates de alto nível ganharam corpo e, mais importante, o apoio ao projeto foi unânime.

Lavadeiras da Prainha, em São Gonçalo do Rio Abaixo: resgate das cantigas da beira do rio

Os eventos foram organizados pelas prefeituras e ou câmaras municipais, sempre com a presença de moradores, produtores rurais, estudantes e autoridades locais. Outro ponto marcante foram as apresentações culturais durante os encontros, caso do congado em Bela Vista de Minas; das Lavadeiras da Prainha, em São Gonçalo do Rio Abaixo; dos pequenos flautistas de Marliéria, que se apresentaram no Parque Estadual do Rio Doce; e dos tambores de Cocais, que rufaram em Coronel Fabriciano, dentre outras manifestações tradicionais.

“Um trabalho muito importante da expedição é esse de incentivar a conscientização das crianças. Se não tem como tirar agora o esgoto que cai no rio, pelo menos devemos tentar gerar menos lixo, desmatar menos as matas ciliares, depredar menos, que tentemos pelo menos não prejudicar um quadro que já é caótico”, alerta Vera Lúcia, moradora e líder comunitária no distrito de Brumal, em Barão de Cocais.

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