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Bar mais antigo funciona há 68 anos no mesmo lugar

Por quase 48 anos, Elair pagou aluguel do ponto de comércio em que seu bar funciona: há 20 anos ele conseguiu comprar o imóvel

FABRICIANO – O comerciante Elair Lima veio para Coronel Fabriciano em 1949, quando o distrito de Calado já havia sido elevado a município. Logo que chegou no vilarejo, ele lembrou que estava sendo construído o colégio Angélica.
Nascido na cidade de Raposos e de uma família de sete irmãos, Elair veio com um irmão que já morava e trabalhava em Fabriciano. Ele tinha 14 anos quando começou a trabalhar no bar.

“Meu irmão foi me buscar para ajudá-lo no bar, que primeiro foi dele. Como já trabalhava em Raposos na função de ajudante de bar, ele me trouxe. Depois ele foi embora para Patos de Minas, lá no Triângulo Mineiro, e me deixou aqui”, contou.
Elair comentou que o irmão recebeu uma proposta de emprego para trabalhar na extinta Mesbla, gerenciando o escritório.

Uma das recordações mais fortes que o comerciante guarda na memória do período em que chegou à cidade era dos carros que existiam em Coronel Fabriciano: apenas três.
“Quando cheguei aqui só três pessoas tinham carro, o pessoal do Dr. Rubens, o Joaquim Vieira – que tinha uma casa de comércio em frente à Casa do Fazendeiro – e José Avelino. Inclusive meu irmão quebrou a perna e quem acudiu ele foi o Joaquim Vieira, que tinha um comércio de arma. A cidade era muito diferente do que é hoje”, lembrou.

AMENDOIM E BANANA
Os comerciantes daquela época encontravam muitas dificuldades para abastecer os bares e mercearias. Elair recordou que grande parte dos produtos vinha de Belo Horizonte. “O comércio naquela época era muito difícil. Depois que meu irmão me passou a propriedade do bar, iniciei uma fase muito pesada, inclusive a avó do vereador Marcos da Luz me deu uma força muito grande. Muita coisa tinha que vir de Belo Horizonte. Eu tinha só um boteco mesmo, com uma caixa de amendoim torrado e banana. Comecei vendendo isso”, comentou.

Elair relevou que os materiais mais vendidos em seu estabelecimento eram a cachaça para os trabalhadores da Acesita e querosene usado pelas mulheres que viviam na região boêmia de Coronel Fabriciano. “Se não fosse a cachaça não tinha nada até hoje. Demorava muito para repor o estoque, vendia e tinha de comprar mais. Não tinha dinheiro e nem capital, então vendia muita cachaça. Saía muito também querosene, mantinha dois tambores de 200 litros para abastecer as mulheres que trabalhavam na zona. Todas elas cozinhavam no fogão jacaré movido a querosene, que vendia também no bar”, citou.

FIADO
Para oferecer queimadinha para os trabalhadores da Acesita que passavam diariamente em frente ao seu bar, Elair levantava às 3 horas da manhã para preparar a bebida. Ele relembrou que a padaria ficava um pouco mais à frente, o que lhe dava vantagem. “Por aqui em frente passavam os trabalhadores da Acesita para atravessar no bote, não existia ponte. Lá embaixo onde tinha a ponte antiga era uma balsa em que os caminhões atravessavam”, recordou.

A prática de vender fiado também era comum. Elair mencionou que em função da demora para comprar mantimentos, acabava recorrendo ao proprietário da mercearia Santa Efigênia. “Vendia dois sacos de amendoim por semana no bar. Assim que chegava no comércio do Tito, ia lá e arrematava logo 25 kg de amendoim com casca. Ele me vendia fiado porque tinha um crédito com ele. Não tem jeito de não vender fiado, faço isso até hoje. Passei muita fase difícil, mas não me esqueço das pessoas que me ajudaram. Tudo que eu tenho saiu desse bar”, justificou.
Por quase 48 anos, Elair pagou aluguel no ponto em que funciona o seu bar. Só depois de muito esforço é que, há 20 anos, ele conseguiu juntar dinheiro e comprar o imóvel que fica rua Coronel Silvio Pereira, 296.

MUDANÇA
O comerciante disse que a cidade começou a mudar quando anunciaram a criação da companhia de Aços Especiais, antiga Acesita. Da porta do seu bar, Elair viu passar o ex-presidente Juscelino Kubitschek, que veio a Coronel Fabriciano participar da festa de cravamento da estaca inicial da usina, em Ipatinga, em agosto de 1958. “O presidente Juscelino passou aqui na porta e me cumprimentou, a Prefeitura ficava logo em frente, na mesma rua”, relembrou.

A parceria da Usiminas com o grupo Japonês Nippon Steel também fez com que a região boêmia de Coronel Fabricano passasse a ser frequentada pelos orientais. Elair conta que a vinda deles fez com que o comércio melhorasse. “A gente passa raiva, mas é muito melhor do que quando comecei a trabalhar. Não abro mão do meu bar”, diz.


Elair faz a travessia do Melo Viana até o bar de bicicleta: antes, brejo no meio do caminho fazia a bicicleta atolar

‘MAGRELA’
A bicicleta que Elair usa para ir todos os dias para o bar também é um objeto especial. Ele contou que ela tem mais de 60 anos e que a comprou logo que chegou em Coronel Fabriciano. “Essa magrela é meu carro, tenho o documento da bicicleta em casa. Não tinha estrada, então a companhia (Acesita) importou da Inglaterra e doou para os empregados. Tinha muitas valetas pelo distrito e roças. Já tive carro mas hoje não tenho mais, só essa bicicleta. Ela que me ajudou muito na época que comecei com o bar, porque carreguei muito coisa pesada na garupa”, completou.

Quando vai para o Centro de ônibus, Elair diz que compara a mudança que cidade sofreu. Ele vê os carros passando e recorda como era difícil sair do Melo Viana, onde morava, para chegar ao bar. “A hora que venho trabalhar de ônibus e vejo os carros passando, paro para pensar no que já foi a cidade e no que ela se tornou. Ali na baixada do Melo Viana era um brejo, até de bicicleta tive que várias vezes parar a magrela para tirar o barro das rodas, que travavam. Hoje o Centro está mudando muito e se expandindo para aquele lado de lá”, mencionou o comerciante, se referindo aos muitos comércios que foram abertos na avenida Magalhães Pinto.

Elair afirmou que tem muita satisfação de ter vindo para Coronel Fabriciano, na época em que Timóteo e Ipatinga ainda pertenciam ao município. “Fico satisfeito dos meus filhos terem nascido numa cidade igual essa, gosto e não tenho vontade de sair daqui; acho que vou ser enterrado aqui”, concluiu.

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