Cidades

Até breve, Jean

(*) Fernando Benedito Jr.

 

Tão logo Jean Wyllys anunciou a decisão de se auto-exilar e abrir mão do mandato de deputado federal para preservar sua vida, tantas são as ameaças de morte que recebe, o primeiro comentário que me chegou aos ouvidos foi:

– Já vai tarde!

Evidentemente homofóbico e com uma carga inenarrável de preconceito, deixei “passar batido” porque não adianta discutir com os nazi-fascistas bolsonaristas, principalmente quando estão em bandos.

O segundo comentário, imediatamente seguido do primeiro, foi lembrando a cusparada que ele deu no presidente, então deputado federal Jair Bolsonaro, razão pela qual deveria mesmo “rachar fora” para não ser morto. Nenhum comentário sobre as ofensas que sofreu em plenário para as quais uma cusparada foi pouco.

Ainda que a família Bolsonaro seja muito bem relacionada com militares e milicianos, são os seus adeptos mais realistas que o rei, que defendem as piores atrocidades, coisas que às vezes pelo rito do cargo os Bolsonaro nem dizem. Mas seus adeptos e eleitores, defensores do porte de armas, da pena de morte e dos linchamentos ao vivo ou virtuais, não medem esforços em defender seus mitos e suas verdades incontestáveis.

Os perfis são variados, vão dos senhores direitistas que há muito não se via e, agora, estufam o peito cheios de razão; aos agroboys assalariados que repetem o discurso do patrão; aos bacanas da classe média do alto de suas Hilux enfeitadas para rodeio; ou os fortões alienados das academias e crossfits. Os discursos seguem repetitivos e encurtados, com argumentos que têm a profundidade de um pires.

Arriscam debates sobre a geopolítica latino-americana, principalmente contra Cuba, Venezuela e Nicarágua. Repetem os mantras contra os comunistas do Mais Médicos, dos recursos que Lula deu para Cuba e Venezuela, do kit gay distribuído nas escolas públicas, da necessidade de se armar para enfrentar o MST a bala, enfim, dos temas recorrentes que elegeram Bolsonaro sem fazer nenhum esforço para ver um pouco além. Esquecem-se que agora estão no governo e deveriam colocar em prática seus sonhos de um País melhor, de um Brasil acima de tudo e de Deus acima de todos…

Bom, mas o caso é que quando alguém recebe uma ameaça de morte, normalmente abre-se um inquérito, uma investigação para apurar de onde partiu a ameaça, tomam-se medidas para evitar que ela se concretize, ou pelo menos deveriam fazê-lo. Não foi o que ocorreu com Chico Mendes, Dorothy Stang, Marielly Franco, Rodrigo Neto e uma infinidade de outras pessoas, defensores ou não dos direitos humanos, razão pela qual, Jean Wyllys está certo em “dar linha”: o estado brasileiro não garante a vida de ninguém. Nem mesmo de autoridades federais, como um deputado, que deveria ter certas salvaguardas, escolta da Polícia Federal, por exemplo.

E nestes tempos, em que vida e direitos humanos estão em baixa, melhor não baixar a guarda. Portanto:

– Vá em paz, Jean.

E viva!

(*) Fernando Benedito Jr. é editor do Diário Popular.

Você também pode gostar

PHP Code Snippets Powered By : XYZScripts.com